Bundas Egoístas
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Bancos de praça deveriam ter lugar para apenas uma bunda. Poderiam ser grandes o suficiente para uma do tamanho de seis dezenas, mas não o suficiente para caber três bolas de futebol. E a distância entre esses bancos deve ser de ao menos um “Oi, você gostaria de — “ e meio, para dar tempo de levantar e ir embora. Posso parecer injusto ou até mesmo insensível com quem utiliza estes móveis de rua como uma última opção de cama, mas sejamos francos: quando você está sentando em um banco de praça, grande o suficiente para cinco pessoas, e alguém senta ao seu lado, imediatamente sua bunda se comunica com seu cérebro, enviando a seguinte mensagem:
“Mas que porra! Você tinha que sentar justo aqui?”
Logo após os protestos de suas nádegas descontentes, o incômodo da presença de um ser estranho (mas não mais estranho que você) sentado ao seu lado cresce. Você faz de conta que isso é normal, que é direito de qualquer pessoa utilizar esse espaço público, que deve respeitar as bundas alheias e suas opções de locais de descanso, mas não adianta — a sua estava lá primeiro e esta outra é uma invasora.
Cada vez mais incomodada, sua bunda cresce, excedendo os limites do desconforto. Neste ponto, restam apenas algumas opções:
- Aceitar outros seres vivos ao seu lado e trascender sua existência pífia. Automaticamente você evolui espiritualmente e encontra o grande Budah, que lhe parabeniza por seu grande feito, lhe concedendo sabedoria, imortalidade e felicidade eterna;
- Levantar e ir embora, provavelmente para voltar de onde veio ou procurar outro banco (vazio, é claro, e desprovido de bosta de pombo);
- Tirar o celular do bolso e esquecer que existe do mundo a sua volta.
Como todo bom ocupante de bancos públicos, obviamente você vai ignorar a primeira opção, posterga a segunda (sua bunda acha que tem mais direito do que as outras no momento) e escolhe a terceira. O celular, que deveria ser um simples aparelho de comunicação, torna-se a sua esperança de acalmar seus nervos e te distrair o suficiente para esquecer de qualque fato que lhe incomode. Com um trilhão de aplicativos instalados (e apenas três realmente úteis), você arrasta seus dedos pela telinha brilhante impacientemente, esperando encontrar alguma distração para seu traseiro irritado, que já está bolando planos maquiavélicos contra seu novo vizinho. Jogos de frutas, redes sociais, buscas em páginas da internet, fofocas, chats com amigos e toques para celular. Nada. Passa para cachorro falante, jogo de cartas, previsão do tempo, horóscopo, limpar a lista de contatos, e-mail e aplicativos de dietas que nunca funcionam, mas que desta vez vai dar efeito.
O celular volta para o bolso, como um samurai desonrado prestes a cometer “harakiri”. Do tamanho de um elefante, sua bunda não aguenta mais e pede arrego — você finalmente se conforma e levanta para ir embora. Enquanto se distância, a bunda invasora comemora a vitória do território conquistado, içando a bandeira da independência das nádegas sem bancos. Enquanto preparava os coquetéis para celebrar esta luta histórica, surge um novo par de nádegas cansadas e ocupa o local de seu velho e vencido inimigo.
“Mas que porra! Justo aqui?” — e nem smartphone tinha.