DR com Telemarketing

Bruno Torres Boeger
3 min readMay 13, 2019

Dizem que a maioria das brigas acontecem nos momentos mais inesperados, nos pegando de surpresa. Essa, por exemplo, ocorreu enquanto jogava Candy Crush no celular, prestes a passar daquela fase que sua prima, mãe e avó fazem questão de lhe dizer que elas já venceram e ele não - era evidente que não estava feliz. O jogo é interrompido com um número desconhecido e um daqueles DDDs que só nos damos conta que existem numa situação como esta, na qual aparece uma voz que faz a mulher do tradutor do Google parecer humana:

  • Bom dia, eu queria falar com o senhor Arlindo. - Ela fala organizadamente irritante.
  • É ele.
  • Senhor Arlindo, meu nome é Larissa e sou da operadora TeleVoz. Você foi selecionado, por ser especial para nós, para adquirir o nosso novo pacote de TV a cabo, celular e internet!
  • Um novo pacote de TV a cabo...?
  • Isso! Você vai poder ver HBO, Telecine… o senhor gosta de GloboSport? Você vai adorar--
  • Pode parar! Larissa, você sequer sabe se eu tenho uma TV para oferecer isso?
  • Senhor, não temos um banco de dados tão detalhado assim.
  • Banco de dados? Larissa, você me ligou, disse que sou especial para vocês e nem sequer saber se eu tenho uma TV! Você fala isso pra todos os clientes, né?
  • Não, o senhor foi exclusivamente selecionado para essa promoção, pelo ótimo relacionamento que você tem com a TeleVoz.
  • Qual é meu relacionamento com a Televoz?
  • Oi?
  • Que tipo de relacionamento nós temos? É um namoro? Estamos ficando? Amizade colorida?
  • Senhor, eu não estou te entendendo…
  • Por que pra você me ligar, dizendo que eu sou especial, e não sabe nem se eu tenho televisão, não parece nada sério, né? E o meu dia, você sabe como foi?
  • Bom… como foi seu dia, senhor?
  • Agora não adianta - perguntar por culpa não vale! E outra, vocês tanto não estão nem aí para mim que continuam me chamando de senhor. Vê se pode!? Eu nem cheguei nos 30 ainda e você está aí, insinuando que já estou na flor da idade.
  • Mil desculpas, Senh-- digo, Arlindo! O que podemos fazer para melhorar nosso atendimento?
  • E eu ainda preciso dizer pra vocês como vocês têm que me tratar? Cadê a criatividade? Bons eram os tempos que as pessoas inventam coisas, surpreendiam. Agora ta aí, nessas coisas rasas. Passa o cuspe na mão e já enfia a TV a cabo pelo telefone.
  • Senhor!
  • Senhor o cacete, minha filha!!
  • Arlindo!!!
  • Sabe como eu me sinto? Eu me sinto como aquele amante de fim de mês - só liga pra dar ver se quer um planinho novo, pra fechar a meta da semana. Depois que vende, dá dois tapinhas na bunda e tchau. Nunca mais liga. E aí, como eu fico?! Hein, Larissa?!
  • Olha, nós podemos melhorar nosso atendimento… se você adquirir esse pacote, nós lhe daremos toda a atenção que o senhor quiser!
  • Eu conheço muito bem essas promessas, mocinha. Vocês vão fazer isso por um tempo e depois vai voltar tudo o que sempre foi. Eu não serei mais iludido!!
  • Mas senhor!!

E as coisas foram disso para pior: cancelou o pacote de internet e não quis nem saber do pacote de TV. Passou um tempo solteiro, fez aulas de pintura, participou de algumas aventuras, fez reike )mas não entendeu nada das pedras coloridas) e acabou fazendo assinatura com outra operadora de internet - uma que não tinha assinatura de TV.

Mas algumas vezes pensava nos "E ses..." com a Televoz. Será que se ele insistisse um pouco mais ou se tivesse mais paciência, não teria dado certo?! Quem sabe uma conversa com mais calma, cara a cara, não teriam levado ambos para outro lugar?

Talvez… Mas senhor, é o cacete

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Written by Bruno Torres Boeger

Service Designer, Macro Photographer and Chronics

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